2009/06/03

Ficção? I

Uma e vinte da manha naquela cidade pacata que, na Primavera, se cobria de um manto creme, fofinho, maldição para todos aqueles que sofriam de problemas respiratórios. Naquela noite, Mafalda e Inês acabaram o expediente tardíssimo, depois de arrumarem todos os objectos preciosos que mantinham em exposição na Praça Principal, local anual para a Feira Internacional de Lãs e Artesanato de Bardalajeira da Serra. Decidiram, para terminar o dia em beleza, beber um batido no café mais próximo, e reconhecido pelos seus gelados cremosos e sabores únicos, coisa que fizeram com grande prazer, sem saber que, durante muito anos, não voltariam a beber um igual. No ar divertido que sempre tinham as duas, Mafalda brincou com a amiga, que encontrara, dentro da sua mala, o telemóvel da associação onde trabalhavam, “trouxeste o telefone , vamos ser assaltadas”, e riram, como se naquela cidade tal fosse possível. Tudo corria bem naquela noite. O dia seguinte seria mais uma jornada de trabalho, quando o sol começa a aquecer lá fora, e as mentes dão azo a divagações coloridas, pelos sonhos daquilo que se espera ter, sempre, na primavera.
Uma da manhã, pagam e rumam para o carro. Mafalda conduziria, já que Inês adiava a responsabilidade acrescida, para ela e para o próximo, de ter um carro nas mãos. No caminho, uma patrulha da polícia seguiu-as durante um pedaço do trajecto que tão bem conheciam.
--Detesto ter carros de polícia atrás de mim, parece sempre que há algo de mau, de errado.
Mafalda desabafou, com um suspiro de alívio quando perderam o carro branco e azul de vista. Vinte minutos e Inês estaria pronta a sair do carro, depois de uns minutos de conversa, certamente sobre assuntos de injustiça no trabalho ou desarranjos amorosos, típicos na vida de Mafalda, interessada apenas por tipos danificados, com problemas de relacionamento, e problemas consigo próprios. Mais uma vez, riram com a cegueira de muitos, estupidez de outros, e até as suas próprias falhas no reconhecimento de muitos sintomas… afinal, à terceira só cai quem é burro. Com um pé de fora, à frente do prédio, eis senão que uma voz vinda de algures sem que se tivessem apercebido muito bem, surge do nada:
-- Entra, sem barulho!
Empunhava um objecto ameaçador na mão, enquanto agarrava Inês pelo braço, para que a única possibilidade fosse mesmo o regresso ao carro, onde entretanto já entrara o companheiro no crime, no banco de trás.
-- Não façam nada, não digam nada, segue!
Sem saberem o que se passaria a partir daí, naqueles primeiros minutos em que tudo o que viam pelos espelhos eram umas caras desconhecidas, com ar perigoso, tudo lhes passou pela cabeça. Inês lembrou a frase da amiga, temendo que o pior lhe sucedesse naquela noite. Mafalda cumpria as ordens do que, na diagonal, a obrigava a seguir determinado caminho, tal qual instrutor durante as aulas de condução, mas sem o charme e atenção que o dela tinha tido. Em segundos estavam na direcção do desconhecido, com o destino nas mãos daquelas figuras que atrás, na penumbra da noite misturada com as cores artificiais, e dentro das suas roupas largas e chapéus enfiados na cabeça, pareciam tiradas dos filmes que, normalmente “so acontecem aos outros”.

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2 Olhares:

Anonymous Anónimo :

vou ficar à espera do resto

16:47  
Anonymous Anónimo :

Tenho cá para mim que o que está para vir será animado, com muitas peripécias pelo meio e, quiçá, algumas injustiças... mas é só um palpite ;)

Ah, espero que termine com um bem tradicional 'e viveram felizes para sempre...' porque as protagonistas merecem :D

m.

14:25  

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